Sendo um filme produzido por um grande estúdio de Hollywood surpreendeu-me a sensibilidade demonstrada em determinado pormenor em prol da classe trabalhadora. É certo que há muitos filmes que mostram as condições de vida dos trabalhadores, mesmo explicitamente, mas neste caso há um pormenor que normalmente só quem adere à luta proletária percebe: a aprendizagem; a aprendizagem requerida (e necessária) no processo de consciencialização acerca da sociedade em que se vive e na consequente luta pela transformação dessa sociedade.
Tom Joad, personagem principal, é politicamente ingénuo, mas vítima das contradições do capitalismo num momento histórico particularmente difícil e violento à vida humana - a Grande Depressão -, vive com os seus um conjunto de experiências que lhe permite ganhar rapidamente uma consciência de classe e incita-o para acção para lutar por justiça social.
O filme tem uma narrativa cujo ritmo pode não agradar a um espectador mais impaciente, imediatista, mas é extremamente rico em conteúdo, contudo, mais que poder ver e ouvir, é preciso que o espectador saiba reparar. Durante o filme várias temáticas são explicita ou implicitamente abordadas, como por exemplo a natureza de classe das leis e das autoridades (sempre em favor do capital e da propriedade privada), a importância das greves e da união dos trabalhadores, o desenvolvimento da corrupção moral dos homens perante o medo do desemprego e ameaça do patrão, ameaça essa que também incluía o desalojamento, pois os trabalhadores e suas famílias ficavam frequentemente a habitar em casebres emprestados pelos seus patrões, e aborda assuntos como a jorna, a migração... É um filme, que além de uma lição para o personagem principal, é-o também para o espectador.
Quando mais tarde li A Mãe, de Gorki, o filme vinha-me constantemente à cabeça. Além de haver em ambas as obras uma mãe preocupada com a vida do filho, há também um paralelismo na aprendizagem que os personagens desenvolvem, obtendo progressivamente cada vez mais conhecimentos que lhes permitem transformar a sociedade, e em ambas as obras, isso acontecia sobretudo na prática, durante essa luta transformadora. Em Gorki, não me surpreenderia tal sensibilidade em reparar na existência desse processo de aprendizagem, mas num filme de Hollywood que ganha dois Óscares, é estranho. Claro, a introdução do tema da aprendizagem no filme dever-se-á muito ao livro de John Steinbeck do qual ele tem origem - livro que ainda não li.
As Vinhas da Ira é um filme em que o personagem principal é um operário em construção, chama-se Tom Joad como se poderia chamar Joe Hill, o seu nome cantado ou não, é como um espectro que ronda onde quer que haja injustiça e alguém que a combata. Como disse Tom Joad:
Andarei por aí no escuro. Estarei em toda a parte para onde quer que olhem. Onde houver uma luta para que os famintos possam comer, estarei lá. Onde quer que haja um polícia a espancar alguém, estarei lá. Estarei nos gritos das pessoas quando se zangam. Estarei nos risos das crianças quando têm fome e as chamam para jantar. E quando as pessoas comem aquilo que cultivam, e vivem nas casas que constroem. Eu estarei lá, também.
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