quarta-feira, 27 de março de 2013

Steven Wilson - Significant Other


Encruzilhada. Crossroads, [cruzamento] em inglês. Termo usado para simbolizar uma situação de decisão delicada e determinante. Voltar atrás, ao contrário de um precipício, não é solução...

Pullin' back from the precipice
Feel so small now, stars shine bright above

...mas, fica-nos igualmente mais vivo tudo o que nos rodeia. Reavalia-se o valor da vida e contempla-se o meio, por exemplo, a beleza nesta música que...

Passin' through the day, only child
Breathe a sigh, other leads apply

...ao som da guitarra que vai shoegando a angelical melodia faz um incompatível contraste tal como a situação que dá lugar à encruzilhada. Amizade, o valor em contemplação; distorcida pelas guitarras, resta decidir se chegou a hora de deixar a distorção abafar a bela melodia, o inverso, ou fazer fade out.

Raining all day, trying to reach you
Feel so helpless, can't stop counting time (but in)
Don't know why, hands (something) stealin' my heart
Graceful dives', other leads apply* (rain down from the sky) [*]

segunda-feira, 25 de março de 2013

A tese do "bom senso" e de que "no meio está a virtude"


A decisão correcta é dar um tiro no cu do vizinho do segundo esquerdo, dizia um vizinho do primeiro andar. Contudo, parte dos condóminos deram-lhes para filosofar sobre o "bom senso" e que "no meio está a virtude", e juntaram uma maioria de votos que decidiu então dar um banho de leite de burro com pétalas de rosas à vizinha do segundo centro. No centro seria mais seguro para evitar os extremos, disseram em coro.

Depois do banho da vizinha do segundo centro ela morreu juntamente com os restantes condóminos do prédio. Foram assassinados com um extintor pelo vizinho do segundo esquerdo que lhes rachou os crânios a todos. O "bom senso" e a filosofia de que "no centro estava a virtude" resultou numa tragédia que seria facilmente evitada caso, na reunião de condóminos, tivessem antes aprofundado a raiz do problema. Como?

A raiz do problema seria resolvido apenas com um telecomando fazendo a mudança da TVI para um canal com estática. Sim, eu sei, era uma solução radical. Mas é preciso ir ao fundo das questões, à raiz, para se decidir bem, mas no condomínio o assassino - o do segundo esquerdo -, único sobrevivente, continua a ver o programa do Goucha.

quarta-feira, 13 de março de 2013

A cadela da minha vizinha

A cadela da vizinha aqui do prédio ao lado costuma vir largar o cocó no relvado das traseiras. Ela é vista com o saquinho na mão pela vizinhança, mas digna como é, distinta desde a roupa até ao penteado, não ousa perder a postura para cavar um buraco antes da aplicação da adubagem e posterior acomodar da nutrição, e, assim sendo, restaria uma solução até agora nunca presenciada por ninguém: ser a cadela a limpar. Contudo, é no animal que comunidade deposita a sua réstia de esperança.

«A arte não é um espelho para reflectir o mundo, mas um martelo para forjá-lo», disse Vladimir Maiakovski; ora, penso que é mesmo essa a práxis artística da vizinha. E, perante tal digníssimo, distintíssimo e nobre mamífero, tomamos a decisão de lhe render uma congratulação pelas poias com que ela arrebata o relvado, verdadeira eflorescência no contraste com a ausência de mobiliário urbano, dando à paisagem uma identidade especial perante a idiossincrasia e geometria das cagadas da cadela que deixa poucos indiferente.

Caro leitor, tenho pena de não ter uma câmara fotográfica para lhe proporcionar uma apreciação adequada da recente configuração urbanística aqui do relvado das traseiras, mas, tal como dizia há pouco, em forma de agradecimento e homenagem a tão ilustre vizinha, entre duas das suas vanguardistas obras, colocamos na relva um cartaz com a seguinte congratulação:

AINDA BEM QUE V.Exª TEM UM CÃO E NÃO UM BOI

sexta-feira, 8 de março de 2013

Dia da Mulher, por Joana Metrass

Joana Metrass (actriz)
Isto é uma página sobre o meu trabalho é certo, mas o meu trabalho faz parte de quem eu sou e aquilo em que acredito faz-me ser quem sou: 

Dia da Mulher

Oiço vários homens, perante este dia, dizerem algo como “porque não há também um dia do homem”? “que sentido faz haver ainda, hoje em dia, um dia da mulher”? 

Se quisermos ignorar as batalhas passadas e conquistas que merecem ser lembradas e celebradas, pelo menos pensemos nas batalhas ainda por lutar. Não faz sentido nos dias e hoje?

Nos “dias de hoje” existem países que tornaram legal a violação dentro do casamento, existem países que condenam à morte mulheres por adultério, países que consideram as mulheres culpadas das suas próprias violações, países que consideram as mulheres como propriedade do pai, depois do marido e depois ainda de toda a família do marido, países onde as mulheres ainda não podem votar…

Neste nosso Ocidente tão evoluído é tudo tão menos óbvio: “apenas” lutamos, por exemplo: contra a violência domestica (da qual foram vitimas entre 35 e 40 mulheres no ano de 2012 em Portugal, número que está a aumentar e não a diminuir, por oposição ao número de queixas, visto que na maioria dos casos não acontece nada ao agressor a não ser tornar-se mais agressivo após saber da queixa, o medo de fazer queixa aumentou…também as mortes…), lutamos contra o machismo socialmente aceite, escondido em frases como “eu até ajudo em casa” ou mesmo com a falta de informação que faz grande parte das mulheres dizer orgulhosamente “eu não sou feminista” (julgado que o feminismo é o oposto do machismo:as feministas não acham que são melhores que os homens, nem que estes são seres inferiores) mas que vão votar, que trabalham, que vão a tribunal pela guarda dos filhos etc etc etc, conquistas das lutas dessas feministas, esses seres que são “ umas lésbicas ou solteironas, mal amadas, destrambelhadas que queimam sutiãs”.

Só o simples facto de esta ainda ser a ideia geral do que é uma feminista prova que não vivemos num mundo igual, prova que vivemos num mundo de homens em que as mulheres lutam todos os dias para ser vistas como iguais, porque os homens quando lutam são Heróis, as mulheres “umas mal-amadas” ou tantas outras coisas.

Porque é que não existe um dia do homem? Sim, há tantos homens pelo mundo vitimas de tantas injustiças mas não existe nenhum sitio no mundo onde um humano seja descriminado, tenha menos direitos ou menos liberdade, seja portanto vitima dessas injustiças unicamente por ter nascido do sexo masculino.

Hoje em dia a luta das mulheres sofre por até a grande maioria das mulheres achar que já não existe nada por que lutar. A existência do dia da Mulher é essencial para relembrar toda a igualdade e respeito pela diferença que falta conquistar por esse mundo fora.

Este dia é não só por todas as que lutaram e que nos permitiram vivermos como vivemos hoje mas principalmente por todas as que ainda lutam e ainda sofrem. 

Desejava que todas as mulheres do mundo tivessem um bom dia da mulher, infelizmente sei que assim não o é. Mas pelo menos hoje, que todos nos lembremos dessas mulheres. 

E por fim, obrigada a todas as mulheres que me deram os direitos que tenho hoje, e obrigada a todas mulheres com quem cresci e a todas as que tanto admiro.
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Post do ano passado aqui no Três Parágrafos

terça-feira, 5 de março de 2013

A importância do Hugo


A importância de Hugo Chavez e seus governos não se restringem apenas à Venezuela e países vizinhos. A enorme libertação a que promoveu ao povo venezuelano, após sucessivos governos lacaios de direita que deixaram o país num estado absolutamente degradante a todos os níveis, não se limita a deixar sementes de um mundo melhor apenas na América Latina, mas transcende as fronteiras do continente americano.

As nacionalização de sectores vitais da economia permitiu-lhes recolherem recursos antes extraviados e investiram-nos na saúde, educação e habitação, além de lhes ter possibilitado uma readaptação da indústria para satisfazer os interesses do povo e não aos interesses estrangeiros e das elites crioulas. Compreendo que no emaranhado de notícias anti-chavistas profundamente desonestas uma pessoa tenha dificuldade em analisar a evolução social ocorrida naquele país, e se surpreenda ao ver como um Presidente ganha tantas eleições após tanto tempo no poder, mas no caso da Venezuela, não é difícil encontrar documentação que demonstre o progresso social após Chavez se ter tornado Presidente.

Era ainda pouco conhecedor e ingénuo a nível político quando em 2005 comecei a poder tomar atenção ao desenvolvimento social e político na Venezuela. Foi por curiosidade que vi documentários como A Revolução não será Televisionada, e ao pesquisar conheci sites como o Resistir.info, depois o O Diário que continuo a ler com regularidade e, claro, a TeleSur. É verdade que também não era assim tão ingénuo, já nessa altura sabia que quando um país tem uma embaixada dos EUA arrisca-se mais a ter um golpe de Estado, e portanto, ao aprofundar o que se passava na Venezuela, fui aprendendo, fui-me transformando politicamente.

O principal salto de consciencialização política, que esta minha observação me deu na época, foi a compreensão da dimensão da manipulação e da desinformação de que somos alvo quanto ao que se passava na Venezuela; quanto a esse país e quanto a muitas outras questões. Este passo foi importantíssimo para todo um consequente processo de transformação pessoal a nível ideológico, político e muito mais.

Com isto que vos conto, quero evidenciar como pode influenciar um processo revolucionário num longínquo país, nas pessoas de um outro. No caso venezuelano nem se pode dizer que seja uma revolução o que acontecera, contudo, a coragem anti-imperialista e socialista de Chavez e de um povo, teve como consequência directa a consciencialização de muitos outros além de mim, certamente.

Hugo Chavez, que não era comunista, indirectamente, esteve na origem do meu processo pessoal de transformação e consciencialização política que me fez tornar-me em marxista-leninista. O seu legado transcende as fronteiras da Venezuela, e penso que marca o seu nome na história da luta anti-imperialista na América-latina na companhia de Bolivar.

Até amanhã, comandante.

domingo, 3 de março de 2013

A Quantidade e Qualidade da Manifestação de 2 de Março

Ninguém nasce ensinado. Cada nova experiência soma-se a muitas outras que em rede permitem-nos compreender melhor o mundo. As manifestações são também um exemplo disso.

Participei já em várias dezenas de manifestações. Nas primeiras, percebi imediatamente que todos se interessavam com a quantidade de pessoas presentes, pois, obviamente, o sucesso de uma manifestação está correlacionada com o número de indivíduos que juntos fazem multidão. Depois, participando nas seguintes, interagindo com novas pessoas, sendo muitas delas mais experientes e conhecedoras, fui compreendendo que a uma manifestação importa muito mais que somente os números. Afinal, em tudo, a quantidade e a qualidade correlacionam-se (dialecticamente), e portanto, lembrando isso, é fácil de compreender que uma manifestação com 3 milhões de pessoas mas sem direcção política não vale quase nada em relação a uma outra de 50 mil mas com objectivos políticos bem definidos.

Que características qualitativas? Ignorando neste texto as grandes manifestações da CGTP e as do PCP e pensando apenas nas ditas «inorgânicas», a grande manifestação de ontem em relação às anteriores foi qualitativamente bem mais evoluída; destaco quatro pontos:
  • Não serviu apenas como demonstração de descontentamento, mas tinha uma direcção política: um "que se lixe a troika" junto com as suas políticas «de austeridade», e a demissão deste governo; 
  • Deixou para trás o discurso anti-partidário e anti-sindical que animava fascistas e pseudo-democratas convencidos que a democracia se faz sem partidos e sindicatos;
  • Houve uma maior desfulanização da política, apesar de se ter continuado a ver muitas referencias contra o Passos Coelho e o ministro Gaspar... (ver este post);
  • Não houve casos de violência, encorajando assim uma participação ainda maior no futuro de uma imensa camada de pessoas que não se revê em actos do género.
Embora estes quatro pontos sejam uma perspectiva pessoal, ela só pode ser formada após uma longa aprendizagem com quem há muitos anos participa em manifestações, e que retêm um enorme legado de experiências e saberes de centenas de anos de lutas. Só os pobres de espírito abdicarão de aprender e continuarão eternamente presos à discussão exclusiva dos números.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Colectânea de Artigos (Fevereiro de 2013)

  • Sobre o Suicídio, por Liliana Sousa, in kontra korrente;
    Um texto que alerta sobre os factores concretos que promovem o suicídio.
  • Uma invasão da África de grandes proporções está em andamento. Os Estados Unidos estão a instalar tropas em 35 países africanos, a começar pela Líbia, Sudão, Argélia e Níger. Isto foi informado pela Associated Press no Dia de Natal, mas ficou omisso na maior parte dos media anglo-americanos.
  • Turismo en Espanha, por Luis Sepùlveda, in Resistir;
  • Mais do que querelas teológicas, são o dinheiro e as contas sujas do banco do Vaticano os elementos que parecem compor a trama da inédita renúncia do papa. Um ninho de corvos pedófilos, articuladores de complôs reacionários e ladrões sedentos de poder, imunes e capazes de tudo para defender sua facção.
  • "Contra-ciclo", ou a guerra ali ao virar da década, in Companheiro Vasco;
  • O povo é o agente das grandes rupturas históricas. Mas para que ele se assuma como sujeito é imprescindível um nível de consciência politica hoje insuficiente em Portugal. Não estamos no limiar de uma situação pré-revolucionária; longe disso. Os tempos são sombrios e no horizonte próximo esboçam-se novas agressões ao povo por um governo de contornos fascizantes.