Ninguém nasce ensinado. Cada nova experiência soma-se a muitas outras que em rede permitem-nos compreender melhor o mundo. As manifestações são também um exemplo disso.
Participei já em várias dezenas de manifestações. Nas primeiras, percebi imediatamente que todos se interessavam com a quantidade de pessoas presentes, pois, obviamente, o sucesso de uma manifestação está correlacionada com o número de indivíduos que juntos fazem multidão. Depois, participando nas seguintes, interagindo com novas pessoas, sendo muitas delas mais experientes e conhecedoras, fui compreendendo que a uma manifestação importa muito mais que somente os números. Afinal, em tudo, a quantidade e a qualidade correlacionam-se (dialecticamente), e portanto, lembrando isso, é fácil de compreender que uma manifestação com 3 milhões de pessoas mas sem direcção política não vale quase nada em relação a uma outra de 50 mil mas com objectivos políticos bem definidos.
Que características qualitativas? Ignorando neste texto as grandes manifestações da CGTP e as do PCP e pensando apenas nas ditas «inorgânicas», a grande manifestação de ontem em relação às anteriores foi qualitativamente bem mais evoluída; destaco quatro pontos:
- Não serviu apenas como demonstração de descontentamento, mas tinha uma direcção política: um "que se lixe a troika" junto com as suas políticas «de austeridade», e a demissão deste governo;
- Deixou para trás o discurso anti-partidário e anti-sindical que animava fascistas e pseudo-democratas convencidos que a democracia se faz sem partidos e sindicatos;
- Houve uma maior desfulanização da política, apesar de se ter continuado a ver muitas referencias contra o Passos Coelho e o ministro Gaspar... (ver este post);
- Não houve casos de violência, encorajando assim uma participação ainda maior no futuro de uma imensa camada de pessoas que não se revê em actos do género.
Embora estes quatro pontos sejam uma perspectiva pessoal, ela só pode ser formada após uma longa aprendizagem com quem há muitos anos participa em manifestações, e que retêm um enorme legado de experiências e saberes de centenas de anos de lutas. Só os pobres de espírito abdicarão de aprender e continuarão eternamente presos à discussão exclusiva dos números.
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