Vi este filme pela segunda vez há pouco. Da primeira, há poucos meses atrás, a pretensão de escrever um post sobre ele tornou-se impossível por haver demasiadas camadas de compreensão para descortinar neste filme, o que tornou a sua intelectualização em palavras um acto que ultrapassou completamente as minhas capacidades.
Clicar aqui para ouvir a banda sonora |
O enredo é complexo, e essa complexidade vai entropicamente crescendo ao longo do filme, às vezes demasiado, aparentemente, mas não poderia ser de outra forma quando o objectivo é compreender o ser humano, ir mesmo a fundo nessa busca, e ainda reproduzir artisticamente toda a sua riqueza comportamental, das emoções aos sentimentos, com ênfase nos medos e desejos humanos. No filme, o protagonista deseja ir além do seu criador: alguém com génio capaz de sintetizar numa obra cinematográfica a natureza humana, Charlie Kaufman - argumentista que já antes vinha abordando e reflectindo sobre o assunto nos seus anteriores filmes como Eternal Sunshine of the Spotless Mind, Adaptation, Human Nature e Being John Malkovich. Não me lembro de ver noutro filme uma busca tão abrangente acerca do comportamento humano, descendo tão fundo aos seus sentimentos como ao pensamentos; talvez um título: Magnólia - filme onde também participa Philip Seymour Hoffman.
Caden analisando papeis escritos com pensamentos íntimos de várias pessoas |
Charlie Kaufman explora como nunca o fez a dialéctica que há entre a aparência e a essência, forma e conteúdo, enquanto se deixa emaranhar numa teia de percepções da realidade por parte dos personagens em que a realidade subjectiva e a concreta se torna difusa também para o espectador, buscando por respostas que, em vez de as descortinar e encontrar harmonia, gera cada vez mais e mais perguntas. Quanto mais são as questões novas, maior é a tensão e a ansiedade. O protagonista é reflexo maior no filme disto: psicótico com terríveis falhas de auto-percepção que cria uma megalómana obra de teatro com o obsessivo objectivo de investigar a essência de cada ser humano; nessa sua luta por fazer sentido, e pela sua existência, termina por se admitir (ou talvez resignar-se) e compreender que é como todos os outros seres humanos; o protagonista - argumentista e encenador - é também todos os personagens e essas pessoas são também o protagonista, isto é, uma sinédoque.
É um dos mais impressionantes filmes que vi, sobretudo pelo peculiar estilo de escrita. Sem dúvida um dos meus favoritos.
Sem comentários:
Enviar um comentário